23 fevereiro 2007

Paradas nupciais

Falcão-peregrino (Falco peregrinus) adulto.

A época é de frio intenso e de dias nublados mas nas escarpas do Douro Internacional ou nas montanhas da Peneda-Gerês (apenas para referir dois dos mais emblemáticos espaços naturais ibéricos) o amor está no ar...
Sob a forma de vôos picados e disputadas perseguições aéreas ou antes pacíficos vôos planados de aproximação cautelosa este é um tempo crucial para as nossas mais emblemáticas rapaces e aves necrófagas.
Nas penedias agrestes do Gerês o silêncio é quebrado por pios agudos, o céu rasgado por descidas vertiginosas próximo dos 250 Km/h e a colónia local de Pombos-das-rochas (Columba livia) dizimada por um macho de Falcão-peregrino (Falco peregrinus) desejoso de oferecer mais uma prenda à sua amada. Com a quase extinção da Águia-real (Aquila chrysaetos) na principal área protegida portuguesa (que perda...) os seus territórios tradicionais foram ocupados por vários casais de falcão-peregrino que agora aqui prosperam. Triste sina para as restantes aves do Parque Nacional pois a sua vida encontra-se permanentemente em risco. O espectáculo esse é garantido...
No Vale do Douro, numa das principais colónias de Grifo (Gyps fulvus) europeias, é possível observar durante longas horas vários casais a evoluirem paralelamente numa atitude de respeito mútuo e de fidelidade que choca frontalmente com a opinião generalizada de repulsa que se tem por estes abutres. Também a rainha das aves por vezes se mostra e nesses momentos é garantido que os nossos olhos jamais esquecerão as duas águias-reais que com as garras entrelaçadas despenham-se quase até ao rio para no último instante se soltarem e planarem de volta à arriba.
Dentro de algumas semanas o tempo será de poupança de energia para a difícil tarefa da nidificação bem sucedida mas por enquanto é hora de estreitar laços, de defender o território e de desafiar os limites do vôo!

19 fevereiro 2007

Garças-boieiras na cidade do Porto



Bando de Garças-boieiras (Bubulcus ibis) frequentam uma extensa veiga no limite Nordeste da cidade do Porto.

Frequentadora habitual das pastagens do Sul de Portugal a Garça-boieira (Bubulcus ibis) tem sido avistada com regularidade ao longo dos últimos meses na cidade do Porto. Trata-se dum bando de entre 10 a 20 animais que frequenta assiduamente os pequenos campos agrícolas da porção Oriental da cidade observando-se ocasionalmente nos terrenos contíguos aos nós de acesso da movimentadíssima Via de Cintura Interna. Sendo uma espécie pouco frequente em todo o Norte do país não deixa de ser curioso verificar que actualmente a cidade do Porto representa um dos poucos locais onde ocorre de forma regular.
A garça-boieira é uma ave com cerca de 50 cm de altura, muito branca, que forma colónias em bosques contíguos a linhas de água encontrando-se acompanhada frequentemente por outras garças ou cegonhas. Alimenta-se em pastagens e culturas de regadio (como arrozais) seguindo habitualmente o gado nas suas deambulações. Trata-se de uma espécie residente da Península Ibérica, não ameaçada, cuja população em meados dos anos noventa compreendia cerca de 70 mil casais reprodutores e cuja área de distribuição se encontra em expansão.

14 fevereiro 2007

"O Pinheiro-silvestre primitivo da Serra do Gerês"

"Ainda hoje está bem viva na memória a imagem do nosso primeiro avistamento de um grande pinheiro-silvestre primitivo. (...)
Neste vale profundo, muito encaixado, em que a toponímia
faz supor que a águia-real terá aqui nidificado no passado,
os imponentes pinheiros criam um ambiente com uma certa magia."
Miguel Dantas da Gama in
O Pinheiro-silvestre primitivo da Serra do Gerês.


Foi lançado recentemente um livro sobre um dos mais ricos e menos conhecidos patrimónios do Parque Nacional da Peneda-Gerês: os Pinheiros-silvestres (Pinus sylvestris) autóctones deste enclave.
Da autoria de Miguel Dantas da Gama, dirigente do FAPAS (Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens), apaixonado desde há vários anos pela principal área protegida portuguesa, chega-nos um completo ensaio sobre esta árvore que "em Portugal apenas será espontânea da Serra do Gerês". Após uma introdução ao tema em que se sublinha que a existência destes exemplares primitivos constituiu um dos valores fundamentais para a criação do único Parque Nacional português, o autor avança para o que mais valoriza a obra, ou seja, a apresentação de dados exaustivos baseados num intenso trabalho de campo.

Foi necessário calcorrear quase 150 quilómetros pelas encostas íngremes da serra mais bela do país para se obter um censo completo dos 4 núcleos de pinheiro-silvestre existentes, referenciando-se um total de 1770 árvores das quais 181 são notáveis pelo seu porte e antiguidade.
Parabéns ao Miguel Dantas da Gama por mais este trabalho em prol do Gerês, atribuindo o devido valor a uma característica única desta montanha tão especial!

09 fevereiro 2007

Camurça: a montanhista multifacetada

Postura clássica de uma Camurça (Rupicapra rupicapra) que desde um cume elevado observa atentamente o excursionista que escala a "sua" montanha.

Estas imagens obtidas por uma câmara fotográfica automática provam que mesmo durante o Verão as camurças frequentam assiduamente o bosque, compartindo este habitat com ungulados como o Corço (Capreolus capreolus) ou o Veado (Cervus elaphus).


A designação latina de Camurça (Rupicapra rupicapra) significa literalmente a cabra das rochas escarpadas. E com efeito este belo animal, presente na Península Ibérica nas cordilheiras Cantábrica e Pirenaica, é dotado de uma agilidade assombrosa que lhe permite trepar até aos cumes mais inacessíveis. Autêntico especialista destas montanhas geladas a camurça possui uma útil membrana interdigital que aumenta a superfície de apoio sobre a neve.
Embora seja um lugar comum assumir-se que no Verão este mamífero refugia-se nas altas montanhas e que apenas no rigor do Inverno deambula pelos bosques autóctones, onde é vítima frequente de predação por parte do Lobo (Canis lupus), tal não corresponde à verdade. A colocação de câmaras fotográficas automáticas num bosque cantábrico onde para além da camurça concorrem várias espécies de ungulados como o Veado (Cervus elaphus), o Corço (Capreolus capreolus) ou Javali (Sus scrofa), permitiu concluir que mesmo durante o estio todos estes animais competem pelo mesmo espaço e, de forma genérica, pelo mesmo alimento. Assim é frequente o registo fotográfico de camurças em faiais ou carvalhais remotos ao longo dos meses de Julho, Agosto e Setembro (ver imagens acima reproduzidas).
Com uma população estimada em 16000 camurças na Cordilheira Cantábrica e cerca de 35000 nos Pirinéus, trata-se de uma espécie actualmente não ameaçada cujas baixas periódicas de efectivos estão relacionadas com epidemias como a sarna ou a queratoconjuntivite.
O facto de apresentar actividade diurna e uma grande curiosidade para com o caminhante que percorre os seus domínios (principalmente nas áreas protegidas onde a sua caça é vedada) faz com que seja um símbolo de locais de beleza inigualável como os Parques Nacionais dos Picos de Europa ou de Ordesa y Monte Perdido e como tal já bem conhecida de um número apreciável de excursionistas portugueses.