04 dezembro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 6)

Lobo-ibérico fotografado no interior de um pinhal, próximo ao local de reprodução.
 
Lobo dominante da Alcateia de Bragança, patrulhando o seu território após um nevão.

O gato-bravo apresenta no território estudado um padrão de actividade principalmente diurno.

Discussão

O seguimento ao longo de vários anos de uma alcateia permite a aquisição de conhecimentos aprofundados sobre o grupo familiar, a evolução populacional das restantes espécies com as quais comparte o território e factores de ameaça para a sua conservação.
Próximo à cidade de Bragança o ano de 2008 foi favorável ao lobo. A sua reprodução decorreu sem intercorrências, com a sobrevivência de pelo menos 3 das crias. A considerável actividade diurna desta espécie (mais de 1/3 das fotografias obtidas) demonstra a tranquilidade do território.
Favoráveis são também os dados obtidos relativamente a outras espécies com interesse conservacionista: aumentou a detecção de marta, estabilizou a detecção de gato bravo. Entre a restante comunidade de carnívoros constatou-se a utilização de espaço pelo texugo e fuinha, diminuindo a detecção de raposa e gineta.
Relativamente às principais presas do lobo, verificou-se um aumento da população de javali, estabilização da população de veado e diminuição da população de corço.
De forma semelhante ao verificado noutros trabalhos de seguimento da população lupina no Distrito de Bragança pelo método da armadilhagem fotográfica (Luís Moreira, comunicação pessoal) constatou-se uma frequência de detecção de lobo superior a 20% na segunda metade do ano e próximo ao local de cria. A validação desta razão como indicador de reprodução, assume-se como um desafio a confirmar no futuro.

Agradecimentos

Agradeço ao Dr. Luís Moreira o seu apoio imprescindível. Agradeço à minha família a paciência interminável que sempre demonstrou ao longo destes anos de trabalho de campo.

28 novembro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 5)

Nesta imagem surgem as 3 crias da Alcateia de Bragança nascidas durante 2008, aqui com cerca de 6 meses de idade.

A actividade diurna desta vara de javalis demonstra bem a tranquilidade do território.  

O texugo apresenta um padrão de actividade principalmente nocturno.

Estações de escuta

Realizaram-se 3 estações de escutas, próximo ao local de criação da Alcateia de Bragança ao longo de 2008. Os resultados encontram-se descritos na tabela 2.

15 novembro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 4)




Crias de Lobo-ibérico (Canis lupus signatus) da Alcateia de Bragança, fotografadas aos 4 meses de idade, com recurso a dispositivo fotográfico automático.

Armadilhagem fotográfica

A armadilhagem fotográfica permitiu a confirmação da reprodução da alcateia de Bragança durante o ano 2008. No dia 2 de Setembro, às 10 horas da manhã, 3 crias de lobo foram fotografadas na estação mais próxima ao local de cria.
Durante o período em análise obtiveram-se 67 fotografias de lobo, 18% das quais (número - 12) correspondentes a crias. 
A detecção desta espécie foi superior na segunda metade do ano: a frequência de fotografias de lobo entre Janeiro e Agosto foi de apenas 0,6% e entre Setembro e Dezembro de 22,3%.
No gráfico 2 apresenta-se a actividade detectada da alcateia, que ocorreu a diferentes horas do dia.

Gráfico 2

A percentagem de fotografias diurnas de lobo foi de 39% (número - 26). Os períodos do ano em que se constatou maior actividade durante o dia foram o Verão (46%; número - 12) e o Inverno (38%; número - 10).
Na tabela 1 apresenta-se os outros mamíferos detectados pela armadilhagem fotográfica para além do lobo, bem como a respectiva frequência de número de fotografias.

Tabela 1

Através da comparação directa destes dados com os dados obtidos em 2007, calculou-se a evolução da tendência populacional para cada uma das espécies.

03 novembro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 3)


A poucos quilómetros da cidade de Bragança existe um local partilhado em simultâneo por 2 "mitos" da Fauna Ibérica: o Lobo (Canis lupus signatus) e a Marta (Martes martes), conforme as imagens documentam.

Resultados

Esforço de campo

Durante o ano 2008 foram realizadas 12 deslocações à área de estudo e percorridos a pé cerca de 47 km. Foram colocadas 24 estações fotográficas (número máximo de câmaras colocadas em simultâneo = 2) correspondendo a um total de 616 dias de amostragem. Realizaram-se 3 estações de escuta.

Percursos realizados

A variação da detecção de sinais indirectos de presença de lobo ao longo do ano 2008 encontra-se representada no gráfico 1.

Gráfico 1

Constata-se que a alcateia residente marcou de forma contínua o seu território. Esta marcação foi mínima durante o inicio do período de criação (Março, Abril e Maio), atingindo o máximo aquando das primeiras deslocações das crias de ano (Setembro).
Foram detectados 27 dejectos de lobo, a maioria composto por pêlos de javali (51,8%; número - 14). Apenas foram identificados restos de cervídeos em 25,9% (número - 7) dos dejectos analisados.

25 outubro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 2)


Alcateia de Bragança numa noite de caça e uma das suas principais presas, o Veado (Cervus elaphus).

Metodologia

O seguimento da alcateia de Bragança efectuou-se através de 3 métodos distintos: realização de percursos pré-definidos com registo de sinais indirectos de presença, armadilhagem fotográfica e estações de escuta.
A realização de percursos pré-definidos teve como objectivo a obtenção de um índice relativo de abundância da espécie. Foram considerados os sinais indirectos de presença, como a existência de dejectos e “esgaravatados” ao longo dos trilhos percorridos. Os dejectos foram classificados de acordo com o conteúdo, como contendo restos identificáveis de Cervídeo (Corço -Capreolus capreolus- ou Veado -Cervus elaphus-), Javali (Sus scrofa) ou Outros (incluindo de origem indeterminada).
A armadilhagem fotográfica foi utilizada de forma a permitir a “observação” da espécie, determinar padrões de utilização de território e períodos de actividade, para além de confirmar a sua reprodução. De igual modo procurou-se obter um índice relativo de abundância das principais presas do lobo, bem como caracterizar as restantes populações de mamíferos. De forma a perturbar o mínimo possível a espécie, as estações fotográficas foram colocadas a uma distância superior a 300 metros do local habitual de cria.
A realização de estações de escuta teve como objectivo confirmar a reprodução e avaliar o sucesso reprodutor da alcateia de Bragança.

10 outubro 2009

Alcateia de Bragança - seguimento durante o ano 2008 (parte 1)


Lobos-ibéricos (Canis lupus signatus) pertencentes à Alcateia de Bragança, fotografados com recurso a dispositivos automáticos dotados de flash (imagem superior) e de emissores infravermelhos (imagem inferior).

Introdução

O Lobo-ibérico (Canis lupus signatus) é uma espécie ameaçada de extinção em Portugal. Perante as rápidas, e por vezes profundas, alterações de habitat que se verificam nos locais habitados pelo lobo torna-se necessário o desenvolvimento de estudos de monitorização da espécie projectados a longo prazo.
A alcateia de Bragança habita numa área localizada a cerca de 20 quilómetros da cidade com o mesmo nome. O seu território encontra-se em contiguidade com a população lupina espanhola representando, pelas suas características de tranquilidade, disponibilidade de presas selvagens e ausência de conflito com o Homem, uma das áreas mais adequadas para o estabelecimento da espécie em Portugal.
Esta alcateia é acompanhada num esforço contínuo de monitorização desde 2006 (vide postagens anteriores neste mesmo blogue), ano em que se confirmou a sua reprodução. Em 2007, apesar da abundância de registos fotográficos de indivíduos pertencentes a este grupo familiar e da detecção de inúmeros sinais de presença, não foi possível confirmar a sua criação. Refira-se que nesse ano verificou-se um incêndio de proporções consideráveis, no final do mês de Abril, próximo ao local tradicional de cria.
Ao longo das próximas semanas serão publicados no blogue Fauna Ibérica os dados relativos ao seguimento desta alcateia durante o ano 2008.

Nota importante: tratando-se de uma espécie com especial interesse de conservação, todos os dados obtidos foram facultados em primeira mão ao Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB). O autor encontra-se agradecido a esta entidade oficial pela emissão da indispensável autorização para a realização de trabalho de campo e enaltece o excelente espírito de colaboração que se verificou em todos os momentos.

27 setembro 2009

O Gato-bravo e a Lebre

Gato-bravo (Felis silvestris) com uma Lebre (Lepus granatensis) recém-capturada.

O Gato-bravo (Felis silvestris) é um dos mamíferos mais esquivos e menos estudados da nossa Fauna. O seu estatuto de conservação, segundo o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (Instituto da Conservação da Natureza), é de Vulnerável, assumindo-se um declínio acentuado da sua população nos últimos anos.
Trata-se de um predador que privilegia na sua dieta o Coelho (Oryctolagus cuniculus), a Lebre (Lepus granatensis), os roedores, como o Rato-do-campo (Apodemus sylvaticus) e as aves, principalmente os passeriformes. Enquanto a observação na Natureza de um gato-bravo é bastante difícil, a visualização de um lance de caça é um evento extremamente raro, mesmo para um indivíduo que dedique grande parte da sua vida ao estudo da Fauna Ibérica. 
A imagem que aqui se expõe assume por isso um significado especial. Nela se observa um gato-bravo fotografado às 6 horas da manhã do passado dia 6 de Setembro no Nordeste Transmontano, transportando pela boca uma lebre recém-capturada. Permite constatar a elegância felina deste animal tão secreto, comprovar a sua capacidade de caça, atestar a sua força no transporte de uma presa que pode atingir um peso semelhante ao seu.
Acima de tudo esta fotografia é o testemunho maior de um Portugal selvagem que há muito aprendi a admirar... 

05 setembro 2009

O desaparecimento estival do Rio Maças


Estas imagens mostram algo pouco comum: o desaparecimento completo de um rio devido à escassez de precipitação ao longo do último ano hidrológico. 

As pessoas mais idosas das aldeias circundantes não se lembram de algo assim: o Rio Maças, que forma um dos mais belos vales do país, desapareceu...
Conforme testemunham as fotografias, desde meados de Agosto que a água deixou de correr nesta região do Nordeste Transmontano. À escassez de chuvas do Inverno juntou-se uma Primavera anormalmente seca e um Verão de elevadas temperaturas que conduziram a este desfecho. O desaparecimento do rio acarreta consequências sérias para a Fauna e Flora locais, contudo trata-se de um evento transitório, integrado num ciclo natural mais amplo. 
O inédito deste registo deve-se também a um outro factor: é que o Rio Maças, desde a nascente até à foz em pleno Sabor, é um rio selvagem, com uma ausência quase completa de barragens. E nos rios selvagens verifica-se isto mesmo: períodos de seca alternados com cheias, estabelecendo condições ambientais extremamente desafiantes para todos os seres vivos. E é a partir de laboratórios naturais de extremos como este que se desenvolve a biodiversidade... 

24 agosto 2009

Amieiros centenários num vale remoto

Águas frias e rápidas com um bosque ribeirinho no seu apogeu, ou imagens de um Portugal superior.

Exemplar de Amieiro (Alnus glutinosa) centenário, num vale paradisíaco.

O perímetro do tronco deste amieiro atinge vários metros.

Raízes "embebidas" em água cristalina, num local recôndito do vale.

Primeiro atravessa-se um extenso carvalhal de Carvalho-negral (Quercus pyrenaica), depois prados há muito abandonados do seu propósito agrícola e finalmente vislumbra-se o vale. Poucos lugares como este ainda restam na Península Ibérica: um rio de águas translúcidas envolvido por uma galeria ripícola na qual predominam Amieiros (Alnus glutinosa) centenários!
Caminhar ao longo do vale corresponde a uma viagem no tempo, pois a cada curva do curso de água sucedem-se as árvores monumentais. Esta galeria lenhosa ribeirinha, que durante séculos escapou ao fogo e ao machado do Homem, fornece matéria orgânica em abundância ao leito fluvial. Cria assim as condições para o estabelecimento de colónias de microorganismos decompositores e de invertebrados aquáticos, base da alimentação de aves tão raras como o Melro de água (Cinclus cinclus).
Tão antigo e tão frágil (motivo pelo qual não revelo a sua localização, que me perdoem os leitores), este ecossistema constitui uma amostra insuperável  do que o nosso país tem de melhor...

16 agosto 2009

Corços em cio




Fêmea seguida por macho de Corço (Capreolus capreolus), às 11 horas da manhã, num dia quente de Julho no interior Norte de Portugal.


Agosto é o mês de acasalamento para os Corços (Capreolus capreolus). Os hábitos esquivos desta elegante espécie tornam contudo difícil presenciar na Natureza os comportamentos associados a esta fase do seu ciclo vital.
As imagens aqui reproduzidas mostram uma fêmea de corço a caminhar a meio do dia ao longo de um trilho (fotografia 1) e logo refugiar-se no interior de um pinhal de Pinheiro-bravo (Pinus pinaster) (fotografia 2). Nove minutos mais tarde surge um macho ao longo do mesmo caminho (fotografia 3), o qual também entra na floresta seguindo o rastro da sua parceira (fotografia 4). O que se passou a seguir permanece na intimidade dos corços...
São imagens raras e apenas possíveis em regiões isoladas e livres de pressão humana, como felizmente ainda acontece em determinadas áreas naturais protegidas.

04 agosto 2009

Tarde de Agosto nas margens do Sabor



O azul do céu e do rio, o verde da floresta a espaços centenária das margens e o castanho das fragas compõe as cores de um cenário paradisíaco. A Águia-de-asa-redonda (Buteo buteo) fotografada aguardou ao longo de horas nas margens do rio, talvez à espreita de alguma presa. 

Tarde de Agosto no belíssimo Vale do Sabor. O calor sufoca, tornando ainda mais atraente a imagem do curso de águas límpidas que corre ao fundo da encosta. 
Apesar do estio as recompensas surgem em catadupa para o amante da Natureza: manchas de carrasco que se estendem a perder de vista, uma Águia-real (Aquila chrysaetos) atacada por um Falcão-peregrino (Falco peregrinus) residente, um casal de Melro-d´água que percorre incessantemente as penedias de um rio (ainda) selvagem...
A certa altura os binóculos fixam na silhueta de uma ave de rapina pousada nas margens do Sabor. Durante a próxima hora a ave ora permanece longos minutos imóvel perscrutando o rio, ora se desloca num voo curto para uma outra atalaia localizada a algumas dezenas de metros. 
Trata-se de uma Águia-de-asa-redonda (Buteo buteo), ave que no Norte da Europa caça na espessura florestal mas que no nosso país, talvez devido à escassez de floresta autóctone, se adaptou à predação em espaços abertos. O comportamento que observo, contudo, representa uma novidade para mim.  Estaria esta águia-de-asa-redonda à caça de algum anfíbio incauto?
A resposta permanecerá no Vale do Sabor, pequeno pedaço de um país que ainda surpreende pela sua beleza...

18 julho 2009

Serra da Arada: o território do Lobo a Sul do Rio Douro



Cumes isolados, vales profundos e inacessíveis e a existência de efectivos de gado caprino permitem a sobrevivência do Lobo-ibérico (Canis lupus signatus), a cerca de quarenta quilómetros em linha recta do Grande Porto, em pleno século XXI.

Na fronteira entre os Distritos de Aveiro e Viseu existe uma paisagem de cumes arredondados e despidos de vegetação a perder de vista. Por aqui escondem-se aldeias abandonadas, cursos de águas límpidas e fragas imponentes. Esta é terra onde ainda persiste uma raridade da Península Ibérica: o Lobo (Canis lupus signatus).
Isolado pela recém-construída rede de auto-estradas, perturbado pelas gigantescas turbinas eólicas, vítima de uma menor disponibilidade de alimento devido à redução progressiva das cabeças de gado o lobo ainda resiste... mas até quando?
Integrada na Rede Natura 2000 como Sítio de Importância Comunitária (SIC), a Serra da Arada pelos elevados valores naturais que encerra, e entre os quais se inclui a ameaçada população lupina, é merecedora de um maior grau de protecção ambiental.

24 março 2009

Incêndio na Mata de Albergaria ou o prenúncio de um ano problemático

Mata de Albergaria fotografada no Verão de 2008. Observa-se à esquerda na imagem o vale do Cagademos, entretanto afectado pelo fogo.

Encosta de Bouça da Mó (imagem do Verão 2008), que foi poupada pelo incêndio de 22 e 23 de Março.

Faial (Fagus sylvatica) em Albergaria ou um dos tipos de bosque mais resistente ao fogo.

Falar de fogos florestais não é fácil: há várias maneiras de encarar o problema e cada um considera-se dono da razão. Habitualmente a discussão surge durante a ocorrência de incêndios graves (em termos de área ardida ou de valores ambientais) e raramente se ouvem as pessoas mais conhecedoras e cuja opinião teria mais valor: como técnicos da Autoridade Florestal Nacional, equipas do Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB) ou as equipas de sapadores que estão na frente de "combate". O resultado é a existência de discussões estéreis com um progressivo distanciamento da população urbana relativamente ao tema (não posso deixar de me espantar como é que a notícia de abertura dos principais noticiários televisivos por estes dias relacionou-se com futebol enquanto que decorria o incêndio mais grave da última década na floresta mais valiosa de Portugal Continental).
Combater o fogo em Albergaria é difícil e perigoso. Por isso antes de tudo a minha palavra é de reconhecimento e agradecimento por todos aqueles que nos dias 22 e 23 de Março estiveram na vertente Ocidental de Gerês a combater as chamas. Em especial quero referir a importância das equipas de sapadores florestais, do Grupo de Intervenção de Protecção e Socorro (GIPS, uma das melhores medidas deste Governo) e das equipas do ICNB que, apesar da desorçamentação a que foi votado por governos sucessivos com a consequente desmotivação de pessoal, é um dos elementos-chave para que Portugal não esteja hoje totalmente devassado por interesses economicistas de curto-prazo.
Este incêndio contudo foi bastante grave e há que referi-lo. Ao contrário do que a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) difundiu e a Comunicação Social transmitiu a Mata de Albergaria ardeu mesmo. As chamas consumiram locais únicos como os fantásticos vales do Forno, Monção ou Cagademos. Aqui existiam enormes exemplares de Teixos (Taxus baccata) ou Carvalhos-alvarinho (Quercus robur) que eram percorridos por animais de que pouco se sabe no nosso país como a Marta (Martes martes). 
Neste momento contudo ainda é cedo para falar da destruição que acarretou. O solo que se apresentava húmido pode ter possibilitado a salvação de ilhas de floresta, indispensáveis para o processo de reflorestação natural. Também ainda não acorreu o nascimento de crias de Marta, algo que só se verificará em Abril/Maio.
Os dias de 22 e 23 de Março de 2009 não devem ser esquecidos. A fragilidade da Mata de Albergaria ao fogo, a tendência de desvalorização dos factos por parte dos intervenientes políticos e a sucessão de actos eleitorais nos próximos meses podem constituir, se o Verão for quente e seco, o prenúncio de um ano problemático.

28 fevereiro 2009

Laurissilva: o tesouro da Natureza portuguesa



O melhor da Natureza portuguesa: a Floresta Laurissilva.

A Laurissilva constitui a floresta indígena da ilha da Madeira e é um autêntico tesouro ambiental mundial. Trata-se de um bosque com origem na Era Terciária, há cerca de 20 milhões de anos, e que originalmente cobria extensas áreas da bacia mediterrânea. Com o advento subsequente de períodos glaciares desapareceu do continente europeu apenas permanecendo na Macaronésia (arquipélagos da Madeira, Açores, Canárias e Cabo Verde) como testemunho de um tempo e de animais há muito desaparecidos.
Neste particular Portugal é bafejado pela sorte: a maior mancha de Laurissilva do mundo, e a mais bem conservada, encontra-se na Madeira cobrindo cerca de 20% da superfície da ilha. Os mais de 15 mil hectares de floresta encontram-se totalmente protegidos pelo Parque Natural da Madeira e, conforme seria de esperar pelo elevado valor ambiental que encerra, integra a lista de Património Mundial Natural da UNESCO. 
Por isso numa próxima ida à Madeira não perca a oportunidade de caminhar por uma "levada" e conhecer as 4 lauráceas principais deste bosque sempre verde: Loureiro (Laurus azorica), Til (Ocotea foetens), Vinhático (Persea indica) e Barbusano (Apollonias barbujana). Contam-se pelos dedos de uma mão os locais no mundo onde poderá usufruir de tamanho privilégio e nenhum é tão majestoso como o que se encontra na "Pérola do Atlântico".     

26 fevereiro 2009

O encanto da neve



Fotografias de Raposa (Vulpes vulpes) e Geneta (Genetta genetta) obtidas no Distrito de Bragança, gentilmente cedidas por Luís Moreira, biólogo do Parque Natural de Montesinho.

Neste Inverno os nevões tem-se sucedido com relativa frequência nas montanhas do Norte e Centro do país. Estas condições meteorológicas adversas dificultam a actividade diária da fauna, como a recolha de alimento ou a procura de locais adequados de abrigo.
Torna-se assim possível observar mamíferos como a Raposa (Vulpes vulpes) ou Gineta (Genetta genetta) a enfrentarem condições climatéricas bastante adversas deambulando sob um espesso manto de neve.
Estas imagens, obtidas através de câmaras fotográficas activadas por sensor de movimento e calor, provam que apesar de belo o Inverno é a estação mais dura do ano.

09 fevereiro 2009

Apenas sobrevivem os mais fortes

Macho de Veado (Cervus elaphus), fotografado com recurso a um dispositivo fotográfico automático, atravessa um pinhal nevado no Nordeste do país.

Estes são dias difícieis para a Fauna Ibérica: sucedem-se as frentes atlânticas, a temperatura baixa, a precipitação é abundante e o vento cortante. Nas montanhas do Norte e Centro do país a neve é presença habitual. 
Nestas circunstâncias a procura de abrigo e de alimento por parte dos animais selvagens encontra-se bastante dificultada. Embora correndo um risco elevado frequentemente abandonam locais remotos, como os cumes das serras ou o refúgio dos bosques, para se aproximarem do Homem aproveitando a abundância relativa de recursos disponibilizada pelos nossos aglomerados populacionais. 
Por estes dias a mortalidade da Fauna Ibérica será seguramente considerável. Homens e animais, todos esperam a Primavera... 

29 janeiro 2009

Autor de incêndio próximo a Rio de Onor condenado ao pagamento de 1 milhão de euros

O aceiro visível à direita representa a fronteira entre Portugal e Espanha ou entre o Parque Natural de Montesinho e a Reserva de Caça da Sierra de la Culebra. O pinhal que se vê nesta imagem (obtida pouco antes do incêndio de 2006) foi consumido pelas chamas.

Maio de 2006. J.M.P.R., de naturalidade espanhola, sai pela manhã das aldeias gémeas de Rio de Onor (portuguesa, localizada no Parque Natural de Montesinho) /Rihonor (espanhola, incluída na Reserva de Caça da Sierra de la Culebra) em direcção a uma parcela de terra de sua propriedade que se encontra alguns quilómetros a Norte em Espanha. De forma ilegal e imprudente fez aquilo que tantos proprietários fazem: limpou a vegetação e iniciou a queima de mato sem a necessária autorização.
O dia estava quente e o vento forte. Rapidamente o fogo propagou-se. A poucas centenas de metros, soube-se mais tarde, criava uma alcateia de Lobos-ibéricos (Canis lupus signatus). Enquanto J.M.P.R. regressava de forma dissimulada à aldeia o fogo arrasava 378 hectares de bosque, principalmente Pinheiro-bravo (Pinus pinaster) e Carvalho-negral (Quercus pyrenaica), bem como outros 163 hectares de terreno vegetal. Tratava-se de um bosque maduro, plantado com o objectivo de aproveitamento florestal, contudo que albergava uma importante diversidade biológica sendo comprovadamente frequentado por jóias da nossa fauna como a Marta (Martes martes) ou o Gato-montês (Felis silvestris).
O trabalho de extinção, que contou com ajuda de meios aéreos e assistência portuguesa, prolongou-se por 3 dias. Custou mais de 173 mil euros. Os prejuízos estimados, nomeadamente a perda de madeira de excelente qualidade, foram estimados em mais de 870 mil euros. Há outros danos não contabilizados: no ano seguinte (2007) o lobo não criou na zona e os padrões de ocupação de espaço pelo Veado (Cervus  elaphus)  alteraram-se substancialmente.
Janeiro de 2009. A justiça espanhola condena o autor do incêndio, habitualmente residente em Madrid mas com segunda habitação em Rihonor, ao pagamento de uma indemnização milionária à Junta de Castela e Leão de mais de 1 milhão de euros como única forma de evitar a prisão. O tribunal considerou como gravemente imprudente a actuação do condenado. Refere que, atendendo ao risco elevado de incêndio nesse dia, não tomou as medidas extremas de segurança necessárias, não solicitou a indispensável autorização para a queima de resíduos vegetais às autoridades competentes e atendendo ao lugar onde se iniciava o fogo e aos espaços naturais protegidos envolvidos (Reserva de Caça Sierra de la Culebra e Parque Natural de Montesinho) era previsível um importante dano ao Meio Ambiente.
A sentença é histórica. Os tesouros ambientais da Culebra e Montesinho estão agora mais protegidos.

19 janeiro 2009

O longo Inverno das Cegonhas-brancas no Norte de Portugal

Cegonhas-brancas (Ciconia ciconia) pousadas no ninho em pleno mês de Janeiro, próximo a uma aldeia de montanha do Parque Natural de Montesinho.

Há cada vez mais Cegonhas-brancas (Ciconia ciconia) na Península Ibérica e muitas escolhem abdicar da migração outonal e permanecer entre nós nestes meses frios. Tal é mais comum no Centro e Sul de Portugal contudo, nos últimos anos, este mesmo fenómeno tem-se verificado no Norte do país e inclusive em zonas de montanha.

No Parque Natural de Montesinho o presente Inverno tem obedecido aos padrões habituais, ou seja, sucedem-se os nevões e as temperaturas mínimas não ultrapassaam consecutivamente valores negativos. O Rio Onor, por exemplo, na zona oriental do parque encontra-se praticamente gelado à passagem pela aldeia com o mesmo nome. Causa por isso alguma surpresa constatar que enquanto neva um irredutível casal de cegonhas-brancas permanece imóvel no seu ninho em plena aldeia de Gimonde aguardando por uma meteorologia mais benévola. Constituirá este um exemplo das alterações climáticas e da capacidade adaptativa da fauna a novas  condições ambienciais? Ou será que no passado, quando as populações de cegonha-branca eram igualmente densas, este fenómeno já se verificava?

Não sei a resposta mas espero que a estratégia resulte... na Primavera darei conta do que sucedeu a este casal.

04 janeiro 2009

Corvo-marinho-de-faces-brancas: a ave pesqueira que nos visita de Inverno

Exemplar de Corvo-marinho-de-faces-brancas (Phalacrocorax carbo). Fotografia: Stawomir Staszczuk.

Proveniente das Ilhas Britânicas, Países Baixos e Dinamarca, o Corvo-marinho-de-faces-brancas (Phalacrocorax carbo) é uma ave migradora que visita o nosso país entre Setembro e Abril. Grande, robusta e de coloração escura com excepção de pequenas áreas brancas na cabeça e flancos, trata-se de uma espécie com excelentes dotes para a pesca. 
Percorre com frequência os rios e albufeiras do interior do país no que se distingue do seu parente próximo, o Corvo-marinho-de-crista (Phalacrocorax aristotelis). É comum encontrá-la pousada próximo da água, inserida num grupo, com as asas abertas para melhor secar a plumagem após mergulhos em busca de alimento. 
Na tarde do dia de Natal, após ter observado o voo majestoso de uma Águia-real (Aquila chrysaetos) sobre as escarpas do Rio Sabor, deparei com 3 corvos-marinhos-de-faces-brancas em plena jornada de pesca. Por mais distraído que fosse o observador não podia deixar de reparar no espectáculo: as 3 aves negras sobressaíam de forma bem evidente nas encostas brancas, recobertas de gelo, do vale do Sabor. 
Nos próximos anos é provável que o espectáculo continue: os efectivos desta espécie têm aumentado, calculando-se que a Península Ibérica seja visitada a cada Inverno por mais de 70 mil indivíduos. Mais: a sua reprodução já foi confirmada na vizinha Espanha, havendo pelos menos 60 casais que preferem passar o Verão nas nossas latitudes.