30 dezembro 2006

Lince ibérico: presente e futuro do felino mais ameaçado do mundo (1)

Poucos predadores serão mais belos e graciosos que o Lince ibérico (Lynx pardinus)

Distribuição actual do Lince ibérico (quadrículas a vermelho)

O Lince ibérico (Lynx pardinus) é uma espécie gravemente ameaçada que apenas sobrevive em Portugal e em Espanha ligada a habitats de bosque e mato mediterrâneos.
Entre 2000 e 2003 o lince ibérico foi objecto de um aprofundado censo populacional nas principais áreas potenciais para a espécie utilizando métodos directos e objectivos (como a análise de ADN de excrementos ou a utilização de câmaras fotográficas activadas por sensores de movimento). Os dados obtidos revelaram uma drástica regressão da área de distribuição histórica e dos efectivos populacionais da espécie em toda a Península (El Lince ibérico, Lynx pardinus, en España e Portugal: Censo-diagnóstico de sus poblaciones, Guzmán et al. 2004).
Assim, no final de 2003, apenas sobreviviam cerca de 160 linces ibéricos repartidos em duas populações reprodutoras: a do Parque Nacional de Doñana (com 24 a 33 animais adultos) e a das Serras de Andújar-Cardeña (com 60 a 110 exemplares), ocupando de forma estável uma área de 500 km quadrados. Verificou-se a presença de apenas 8 fêmeas reprodutoras em Doñana e de entre 18 a 23 em Andújar-Cardeña.
Em Portugal, dos 278 excrementos suspeitos de pertencerem a lince analisados, apenas 3 foram positivos: 2 recolhidos no Vale da Ursa na Serra da Malcata em Março de 1997 e outro recolhido na Adiça no final de 2001 (Santos-Reis, 2003). Embora não se possa afirmar a sua extinção no nosso país o cenário é bastante pessimista, com o desaparecimento do lince dos enclaves tradicionalmente mais importantes para a espécie ao longo da segunda metade da década de noventa .
A distribuição deste felino na Península Ibérica corresponde a pequenas áreas remotas que mantêm elevadas densidades da sua principal presa, o Coelho (Oryctolagus cuniculus). Recentemente o seu estatuto de conservação foi reclassificado pela UICN (The World Conservation Union) encontrando-se agora na categoria de "Risco Crítico de Extinção".
No próximo post falarei das medidas actualmente em marcha para impedir a extinção deste símbolo da Natureza Ibérica. Para terminar este texto (e já agora este ano) de forma mais agradável adianto desde já que algumas destas acções têm obtido resultados extremamente positivos...

Para todos os leitores do blogue Fauna Ibérica os meus votos sinceros de um óptimo ano 2007, repleto de saúde e de projectos realizados!

22 dezembro 2006

Snow tracking

Rasto de Lebre cantábrica (Lepus castroviejoi)

Pegada de Javali (Sus scrofa)

Um dos melhores meios para conhecer quais os mamíferos que se movimentam numa determinada área em pleno Inverno é o snow tracking. Como o próprio nome indica trata-se de interpretar os sinais, vulgo pegadas, deixadas pelos animais na neve. Muito utilizada na América do Norte e nos países europeus mais setentrionais esta técnica, por limitações óbvias, raramente é utilizada na Península Ibérica.
Há poucas semanas, em várias saídas de campo na Cordilheira Cantábrica (Principado de Astúrias) numa paisagem recém-nevada, tive a oportunidade de desenvolver os princípios do snow tracking e a ele fiquei rendido devido à qualidade e quantidade de informação que disponibiliza. Assim pude seguir durante várias centenas de metros os passos de uma Lebre-cantábrica (Lepus castroviejoi) num prado de altitude, compreender o movimento de um grupo familiar de Javalis (Sus scrofa) que desceu da floresta em direcção aos campos de cultivo que ladeavam uma aldeia em busca de alimento ou verificar a hesitação de uma Camurça (Rupicapra rupicapra) entre a protecção garantida pelas paredes rochosas da montanha ou o abrigo do rigor climático proporcionado pelo bosque mais próximo.
Entre cumes nevados, florestas despidas e aldeias longínquas, seguindo durante horas os passos da nossa fauna e admirando a sua resistência e tenacidade, estes dias do mais rigoroso Inverno serão porventura os melhores para comungar totalmente com a Natureza...

A todos os leitores do blogue Fauna Ibérica desejo um Feliz Natal!

20 dezembro 2006

Vara de Javalis

Cinco Javalis (Sus scrofa) percorrem um remoto bosque nas montanhas do Norte da Península Ibérica. [Para ampliar a imagem teclar com o botão esquerdo do rato sobre a mesma]

As câmaras fotográficas activadas por sensores de movimento e calor permitem descobrir certos comportamentos da fauna ibérica mais esquiva. Um exemplo disso mesmo pode ser constatado na fotografia acima reproduzida, onde se observa a deslocação de uma vara de Javalis (Sus scrofa) no interior de um velho bosque de Faias (Fagus sylvatica).
Para além da confirmação da presença da espécie nesta floresta a foto permite concluir que a área de estudo é bastante tranquila visto que os 5 javalis foram retratados em plena luz do dia.
Várias questões se poderão colocar perante este documento, obtido em Dezembro: tratar-se-á de um grupo de fêmeas e de juvenis nascidos este ano? Ou será que estamos perante uma vara de suídeos sub-adultos, expulsos da companhia das suas progenitoras agora que estas se encontram em pleno cio? Conseguirão estes animais sobreviver às privações do Inverno e às inúmeras montarias de que serão alvo?

13 dezembro 2006

Rio Sabor: o eixo da Natureza Transmontana (2)


A principal ameaça à preservação da extraordinária biodiversidade do Vale Sabor e dos seus diferentes habitats é a previsível construção da barragem do Baixo Sabor. Impulsionada por um lobby fortíssimo a sua edificação é praticamente inevitável. Como cidadão preocupado com a preservação das áreas ecologicamente mais sensíveis do nosso país sinto-me na obrigação de desmistificar certas considerações que ultimamente tenho lido (fonte: Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, S.A. - promotora do empreendimento)

"A barragem do Baixo Sabor é um empreendimento de elevado interesse estratégico pois aumenta a capacidade de produção de energia".
Esta afirmação está longe de corresponder à verdade uma vez que a energia produzida por esta barragem representará apenas 0,6% da energia consumida em Portugal em 2010. O próprio estudo de impacte ambiental considera que a sua importância energética é insignificante a nível nacional.

"A barragem do Baixo Sabor é um empreendimento de elevado interesse estratégico pois permite dispor de uma reserva de água muito importante, capaz de fazer face a situações de carência".
A construção de uma barragem alternativa no médio/alto Côa, com um impacte ambiental relativamente menor, permitiria a obtenção de uma reserva de água semelhante à expectável para o baixo Sabor (cerca de 600 hectómetros cúbicos).

"A barragem do Baixo Sabor é um empreendimento de elevado interesse estratégico pois numa zona em que se verifica uma desertificação crescente a construção do empreendimento constitui uma grande oportunidade para os projectos de desenvolvimento local e regional"
Se há província em Portugal na qual a construção de não uma mas antes várias barragens ao longo das últimas décadas não conseguiu travar a desertificação das suas povoações essa província é Trás-os-Montes.

Conforme apresentado no post anterior - ver Rio Sabor: o eixo da Natureza Transmontana (1) - o Vale do Sabor é dotado de uma Natureza exuberante e ímpar no contexto europeu.
A forma de desenvolvimento mais sustentável que poderia ser assegurado às gentes que vivem nas suas encostas seria a constituição de uma Área Protegida, talvez sob a forma de Parque Natural que, com o enquadramento financeiro adequado, promovesse e divulgasse os valores naturais da zona, empregasse nos seus quadros habitantes locais, fomentasse o Turismo Rural e formas de usufruição da paisagem ecologicamente correctas como a criação de trilhos pedestres, o Bird Watching, a canoagem, entre outros. A título de exemplo veja-se o que se passa no Principado nas Astúrias, na vizinha Espanha, em que, após o sucesso económico e ambiental que representou a constituição do Parque Natural de Somiedo em meados da década de oitenta, foram criados nos últimos anos mais 4 (!) Parques Naturais em zonas limítrofes, na maioria dos casos por pressão das populações locais.
Ao contrário da mensagem que pretendem fazer passar a construção da barragem do Baixo Sabor deixará o nosso país muito mais pobre...

01 dezembro 2006

Rio Sabor: o eixo da Natureza Transmontana (1)


O Rio Sabor nasce aos 1600 metros de altitude na Serra da Parada (Espanha), percorre cerca de 120 quilómetros e desagua aos 97 metros de altitude na margem direita do Rio Douro. Ao longo deste percurso discorre livre de barragens por alguns dos mais belos locais da província de Trás-os-Montes, encerrando uma riqueza natural tão distinta que a sua preservação se revela fundamental para a preservação da biodiversidade europeia.
O Vale do Sabor apresenta 17 tipos diferentes de habitats naturais, dos quais 4 com estatuto de conservação prioritária, segundo a directiva europeia Habitats. Aqui concentram-se os mais extensos e bem conservados sobreirais e azinhais transmontanos bem como várias espécies de plantas raras, como por exemplo a única população nacional de Arabis alpina ou mais de dois terços dos efectivos de Buxo (Buxus sempervirens).
Águia-real (Aquila chrysaetos), Águia-de-Bonnelli (Hieraaetus fasciatus), Cegonha-negra (Ciconia nigra), Abutre-do-egipto (Neophron percnopterus), Falcão-peregrino (Falco peregrinus), Bufo-real (Bubo bubo) são algumas das mais raras aves europeias que encontram no Sabor um dos seus principais refúgios. Os números dizem tudo: 14 a 16 casais de águia-real, 6 a 10 de águia de Bonelli, 1 a 5 de cegonha-negra, 8 a 11 de abutre-do-egipto, 6 a 10 de falcão-peregrino, 11 a 20 de bufo-real (fonte: Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves). Dificilmente haverá outro local com tal densidade de aves rupícolas...
Orientado no sentido Norte-Sul, verdadeiro eixo de Trás-os-Montes, o Sabor é um autêntico corredor ecológico, onde estão representadas algumas das mais ameaçadas espécies de vertebrados nacionais. O seu estatuto de protecção actual (Zona de Protecção Especial para as Aves e Rede Natura 2000) só peca por escasso. A conservação dos valores ambientais deste vale deveria ser um desígnio nacional.

24 novembro 2006

Flores das Montanhas Ibéricas - Cardo Azul


As montanhas de Portugal e Espanha pelas variadas condições climáticas de que são alvo, na transição dos climas mediterrâneo, atlântico e continental, apresentam uma enorme diversidade botânica. Prova disso mesmo é a extraordinária riqueza florística e arbustiva que se constata numa qualquer caminhada pelos cumes das Serras do Gerês, Montesinho, Estrela ou pelas Cordilheiras Cantábrica e Pirenaica.
A planta acima fotografada é conhecida como Cardo Azul (Eryngium bourgatii). Distribui-se pelos prados localizados acima dos 1200 metros de altitude das principais montanhas ibéricas, montanhas do Rif e Atlas no noroeste de África e montanhas da Turquia e do Líbano no Próximo Oriente. Trata-se de uma planta hemicriptófita, ou seja herbácea que vive mais de um ano mas menos de três cujas gemas (botão escamoso que dará origem às folhas e flores) persistem ao nível do solo. A foto foi obtida durante o mês de Julho, período da floração, destacando-se a belissíma cor azul.

19 novembro 2006

Burro - retrato de um animal em extinção


É de entre os animais domésticos um dos mais ligados ao dono, fiel e dotado de uma ternura extrema. Mas sofre do estigma do seu nome e do abandono das actividades agrícolas tradicionais encontrando-se actualmente à beira da extinção. Falo do Burro (Equus asinus), nobre animal que desde tempos imemoriais auxilia o Homem nos trabalhos mais duros.
Domesticado ainda antes do cavalo, o burro sempre foi considerado ao longo dos séculos como o parente pobre dos equídeos não existindo registros que permitam perceber o surgimento das diferentes subespécies europeias.
Com um trabalho pioneiro e de grande mérito o Parque Natural do Douro Internacional procedeu ao estudo e catalogação de todos exemplares existentes no planalto mirandês, concluindo pela existência de um conjunto único de características, suficientes para a classificação de uma raça autóctone local.
Neste momento há nas terras de Miranda, Mogadouro e Figueira de Castelo Rodrigo orgulho pelo seu burro... e por aquilo que conheço do animal esse orgulho é plenamente justificado! Oxalá seja suficiente para impedir o seu desaparecimento...


Notas
  • Para mais informações consulte o site da AEPGA (Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino)
  • Uma visita à Hospedaria do Convento de Santa Maria de Aguiar, junto a Figueira de Castelo Rodrigo, permite conhecer alguns dos mais bonitos exemplares de burro do Parque Natural do Douro Internacional

09 novembro 2006

Serra do Courel (2): a Devesa da Rogueira

Pico Formigueiros e a Devesa da Rogueira
Trilho no interior da Devesa da Rogueira. A diversidade vegetal é verdadeiramente assombrosa

Na Serra do Courel, montanha localizada na região centro-oriental da Galiza, merece destaque um bosque em particular: a Devesa (nome local para floresta) da Rogueira.
Trata-se de uma das melhores manchas boscosas atlânticas galegas. Encontra-se na vertente Noroeste do Formigueiros (cume mais elevado do Courel, com 1639 metros de altitude), compreende cerca de 4 Km quadrados de superfície e distribui-se numa encosta de declive bastante acentuado, entre os 700 e os 1500 metros de altitude. Nas cotas mais baixas predominam o Carvalho (Quercus robur) e o Castanheiro (Castanea sativa) mas à medida que se sobe surge a Faia (Fagus sylvatica) que, ao contrário das florestas monoespecíficas por ela habitualmente formadas, aqui permite o desenvolvimento de outras espécies arbóreas formando um bosque de uma diversidade impressionante. Abundam os Teixos (Taxus baccata), Azevinhos (Ilex aquifolium), Vidoeiros (Betula pubescens), Freixos (Fraxinus angustifolia) e Aveleiras (Corylus avellana).
À diversidade da flora sucede-se a diversidade da fauna. Estão presentes mustelídeos como a Marta (Martes martes) ou o Toirão (Mustela putorius) e outros carnívoros como o Gato-montês (Felis silvestris) ou o Lobo-ibérico (Canis lupus signatus). Nos ribeiros de montanha encontram-se o Tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai) e a Rã-ibérica (Rana iberica), endemismos do Noroeste peninsular. É possível também observar aves raríssimas no contexto galego como a Felosa-musical (Phylloscopus trochilus) ou o Chapim-palustre (Parus palustris).
A melhor maneira de conhecer este pequeno paraíso é caminhando. Próximo à aldeia de Moreda encontra-se o edifício da Aula da Natureza, aberto aos fins-de-semana, que descreve através de painéis informativos o ecossistema da zona e distribui gratuitamente um mapa com vários trilhos pedestres. Para os mais aventureiros (e em boa forma física...) a melhor caminhada será talvez entre Moreda e a Lagoa Lucenza, atravessando todo o bosque numa dura subida com cerca de 1000 metros de desnível. Para os mais relaxados a ligação entre o Alto do Couto e A Campa constitui um trilho mais adequado, que não apresenta desníveis altitudinais importantes e percorre também belíssimas zonas da Devesa da Rogueira.

06 novembro 2006

Serra do Courel (1): a magia da natureza Galega

Bosque caducifólio, prados e as águas puras do Rego de Pontón: por toda a Serra do Courel sucedem-se exemplos de um bucolismo cada vez mais díficil de encontrar
A povoação de Vidallón, envolvida por um extenso souto de castanheiros, no limite Sul da Serra do Courel
Cascata e bosque rupícola na vertente Oriental do Courel

Na Galiza profunda encontra-se um enclave montanhoso de rara beleza: a Serra do Courel.
Abarcando uma área com mais de 20 000 hectares, esta serra, junto com os Ancares mais a Norte, contitui a terminação da vigorosa Cordilheira Cantábrica. É um território de declives acentuados, com as altitudes máximas no alto do Formigueiros (1639 metros) e Pia Páxaro (1610 metros), sulcado por abundantes ribeiros que drenam para o Rio Lor, um dos cursos fluviais mais bonitos e conservados do noroeste peninsular.
É neste território, fronteira entre o mundo eurosiberiano e mediterrâneo, que persistem até aos nossos dias as chamadas "devesas", bosques de uma diversidade fabulosa, orientados a Norte, onde sobrevivem as Faias (Fagus sylvatica) mais ocidentais da Europa.
Com 93 espécies de aves inventariadas, 40 de mamíferos e 14 de répteis o Courel constitui um dos santuários faunísticos galegos, local onde ainda persiste o Gato-bravo (Felis silvestris), a Marta (Martes martes) ou o Lobo-ibérico (Canis lupus signatus) e onde o Urso-pardo (Ursus arctos), oriundo da recuperada população cantábrica ocidental, é visita ocasional.
No próximo post falarei sobre a Devesa da Rogueira, o bosque mais preservado desta serra e um dos mais emblemáticos da Natureza Ibérica.

27 outubro 2006

Javali: um caso de sucesso

Javali (Sus scrofa) fotografado a cerca de 500 metros de distância do local de criação de uma alcateia de Lobo-ibérico (Canis lupus signatus) no Nordeste Transmontano.
Javalis caminhando sobre um cume nevado do Parque Nacional de Ordesa y Monte Perdido, nos Pirinéus, a mais de 2500 metros de altitude.
Cria de javali fotografada no interior de um carvalhal no maciço montanhoso Alvão/Marão.

É um resistente. Da quase extinção no início do século XX à colonização de praticamente todo o território de Portugal Continental no início do século XXI. Na actualidade e de forma legal são abatidos no período entre Outubro e Fevereiro mais de 14 mil (!) Javalis (Sus scrofa) e muitos mais perecerão à conta da caça furtiva, de doenças naturais ou vítima de predadores. Este suídeo, contudo, persiste. E porquê?
Embora não se encontre seguramente entre os mamíferos mais atractivos da nossa fauna somos obrigados a reconhecer e admirar as suas qualidades. Presente nas serranias agrestes do Norte de Portugal, no estuário do Minho ou no extenso montado alentejano, o javali demonstra uma fantástica capacidade de adaptação a meios de diferentes características, ímpar entre os animais de grande porte. O regime alimentar omnívoro, bastante diversificado, e uma grande capacidade de reprodução alicerçada num elevado número de crias e numa maturidade sexual precoce explicam em parte esta situação.
Mas indubitavelmente um dos factores-chave para a explosão demográfica deste suídeo será a situação precária, por vezes no limiar da extinção, dos seus predadores naturais: Lobo-ibérico (Canis lupus signatus) e Águia-real (Aquila chrysaetos). O seguimento das populações de lobo e javali ao longo de 5 anos (entre 2001 e 2005) realizado pelos FAPAS (Fondo Asturiano para la Protección de los Animales Salvages) numa área da Cordilheira Cantábrica provou a grande pressão predatória de 3 alcateias sobre os efectivos de javali, o que levou a uma diminuição da população do suídeo entre 5 a 12% ao ano, com benefícios indirectos para espécies ameaçadas como o Urso-pardo (Ursos arctus) ou Galo-montês (Tetrao urogallus).
No meio da polémica sobre a expansão recente da espécie e os prejuízos causados às actividades humanas (leia-se agricultura) derivado de tal facto, um princípio não deverá ser esquecido: o javali é uma espécie-chave dos ecossistemas mediterrâneo e atlântico que, como todas as outras, tem direito próprio à existência. E a sua extinção no nosso país esteve prestes a acontecer há apenas uma geração...

19 outubro 2006

Tragédia silenciosa


A meteorologia segue actualmente o seu curso habitual: as temperaturas baixam, as frentes atlânticas sucedem-se e parece que o tempo chuvoso veio para ficar. Há muito que os incêndios florestais deixaram de ser notícia contudo é nesta altura do ano que as suas consequências são mais gravosas. Enquanto que em Agosto o avanço das chamas consumiu alguns dos mais importantes redutos de bosque autóctone do Parque Nacional da Peneda Gerês, destruindo árvores com centenas de anos de existência, a chuva de Outubro arrasta consigo a camada de solo que sustentava a diversidade vegetal, impossibilitando na prática a regeneração florestal.
Segundo Pedro Galán, biólogo, professor da Universidade da Corunha, numa encosta de inclinação média a chuva arrasta mais de 80 toneladas de terra por hectare. O solo formado ao longo de séculos desaparece em poucas semanas. E deste modo a paisagem belíssima de certas áreas remotas do nosso único Parque Nacional não conseguirá recuperar ao longo das próximas gerações...

14 outubro 2006

A chegada das castanhas


Nesta altura do ano no Norte e Centro de Portugal uma das nossas mais belas árvores caducifólias, o castanheiro (Castanea sativa), presenteia-nos com um fruto irresistível, símbolo do Outono: a castanha.
Desde há várias centenas de anos que o Homem a aprecia. Na Idade Média, antes da chegada do milho e da batata, constituía a base da alimentação da população rural, facto que explica a proximidade dos soutos às aldeias.
Autêntico concentrado energético, o consumo de castanhas permite a uma grande comunidade de aves e mamíferos enfrentar o Inverno nas melhores condições físicas. Com efeito próximo a bosques de castanheiros é comum encontrar rastros de mamíferos esquivos como o Javali (Sus scrofa) ou a Fuinha (Martes foina). Quando se avizinham dias chuvosos com noites longas e frias, no período mais crítico para a fauna ibérica, a Natureza, talvez como compensação, disponibiliza um dos seus melhores manjares.

06 outubro 2006

Auto-estrada eólica


Num dos locais mais belos e remotos da Serra do Alvão foi há dois anos implantado um parque eólico. De visita a essa zona não pude deixar de ficar incomodado: rasgando a serra, atravessando os vales mais recônditos e a zona de cumeada, existe agora uma autêntica estrada (quase auto-estrada...) que foi construída de raiz para o transporte dos gigantescos aerogeradores. Para além do irreversível impacto paisagístico verifica-se agora o trânsito de veículos todo-o-terreno, motorizadas ou mesmo automóveis citadinos por locais de grande valor ecológico. Simultaneamente encontramos uma grande quantidade de detritos por toda a montanha, principalmente ao longo da via de acesso às torres eólicas.
Bem sei que a energia eólica é uma forma de energia renovável e não poluente, necessária ao nosso conforto pessoal e à economia do país mas deixemo-nos de hipocrisias: não a chamem energia verde pois de verde nada tem... que o digam a floresta rasgada ou os prados de altitude cheios de lixo da Serra do Alvão!

01 outubro 2006

Sierra de la Culebra - o imenso território do Lobo



"No tenía par. Ningúm otro lugar podía compararse, en esplendor primigenio, a la Sierra de la Culebra. Allí era de ver la estepa infinita, los horizontes profundos, marcando el límite natural entre Aliste y Sanabria. Sin sentirse arrebatado, allí mismo, por el proprio misterio, no sería uno capaz de conocer la naturaleza y, menos aún, de acceder al conocimiento del lobo." Estas palavras são de Ramón Grande del Brio, um dos maiores estudiosos do Lobo-ibérico (Canis lupus signatus), e reflecte, de maneira magistral, o encanto da serra europeia onde o lobo alcança a sua maior densidade.
Localizada junto à raia portuguesa, limitada a poente pelo Parque Natural de Montesinho, a Serra da Culebra é uma extensa elevação montanhosa de pequena altura, disposta no sentido NW-SE, que deve o seu nome à forma serpentiforme dos seus cumes. As altitudes oscilam entre os 900 e os 1200 metros, alcançando o valor máximo no pico de Peña Mira, com 1243 metros de altitude.
A paisagem é dominada por bosques de Carvalho-negral (Quercus pyrenaica), pinhais de Pinheiro-bravo (Pinus pinaster) e Pinheiro-silvestre (Pinus sylvestris), intercalados por matos e pequenas parcelas cultivadas junto às aldeias. Nesta área com mais de 60 mil hectares, pertencente à rede de Espacios Naturales de Castilla e León, habitam importantes comunidades de herbívoros, como o Veado (Cervus elaphus) com mais de 1200 exemplares, o Javali (Sus scrofa) com cerca de 1000 indíviduos, ou o Corço (Capreolus capreolus). Os 6 grupos familiares de Lobo-ibérico que percorrem a Culebra alimentam-se, quase em exclusivo, destas presas selvagens pelo que este ecossistema constitui um raro exemplo de equilíbrio natural entre presa e predador ainda existente na Península Ibérica.
A todos os amantes da Natureza recomendo vivamente uma visita a esta terra de horizontes sem fim, autêntico paraíso para a fauna.

19 setembro 2006

A Brama do Veado


Nesta altura do ano nas Serras do Nordeste Transmontano, no Parque Natural do Tejo Internacional ou no Alentejo raiano desenrola-se um dos espectáculos naturais mais fascinantes da Fauna Ibérica: a Brama do Veado (Cervus elaphus).
Percorrendo os cumes isolados das Serras do Montesinho ou da Coroa é possível ouvir, a qualquer hora do dia ou da noite, longos e potentes bramidos emitidos pelos machos de veado, que assim procuram dominar as melhores áreas, as que apresentam o maior número de fêmeas, e intimidar os possíveis concorrentes. Por vezes a vocalização, o tamanho corporal e a ostentação das hastes não são suficientes para desmotivarem os machos concorrentes e nessa altura o confronto é inevitável. O choque das hastes e a tentativa de empurrar o adversário para fora do território, apesar da sua espectacularidade, habitualmente não provocam lesões graves. O vencedor da contenda tem ainda um longo trabalho pela frente: terá que defender o território recém-conquistado durante vários dias até que seja aceite pelo grupo de fêmeas e estas se encontrem receptivas à cópula.
O macho acima retratado, fotografado a 15 de Setembro por uma câmara activada por um sensor de movimento, dirigia-se para um conhecido local de alimentação de um numeroso grupo de fêmeas. Nessa zona esperava-o outro macho que desde há algumas semanas dominava o local. Com pesar informo os leitores do blogue Fauna Ibérica que o nosso exemplar perdeu a batalha... por enquanto!

14 setembro 2006

Vale do Águeda: o desfiladeiro mais selvagem (2)

Grifo (Gyps fulvus) em vôo tipo "soaring" sobre a
encosta direita do Vale do Águeda

Painel de azulejo em Almofala, a aldeia dos abutres e das águias

O vale do Rio Águeda é uma das regiões mais importantes da Península Ibérica no que respeita à avifauna. Neste canhão remoto nidificam o Abutre-do-egipto (Neophron percnopterus), símbolo do Parque Natural do Douro Internacional, o Grifo (Gyps fulvus), que aqui possui uma das maiores colónias de nidificação no nosso país, a Águia-real (Aquila chrysaetos), que no concelho de Figueira de Castelo Rodrigo apresenta uma das maiores densidades populacionais da Europa Ocidental, e também as raras Águia-perdigueira (Hieraetus fasciatus) e Cegonha-negra (Ciconia nigra).
Desde a aldeia de Almofala parte um cómodo trilho pedestre de cerca de 3 quilómetros de extensão que termina na Igreja de Santo André, miradouro privilegiado sobre as arribas do Águeda, onde, com os indispensáveis binóculos e guia de aves e uma dose razoável de paciência, se podem observar todas as espécies acima descritas.
Fica a certeza de nesse local, independentemente dos avistamentos efectuados, desfilar perante nós o melhor de um Portugal Natural, há muito perdido em grande parte do restante território...

09 setembro 2006

Vale do Águeda: o desfiladeiro mais selvagem (1)



Em plena Beira Alta, ao longo da fronteira com Espanha, junto às aldeias de Almofala, Mata de Lobos e Escalhão encontra-se uma das mais belas paisagens naturais da Península Ibérica: o desfiladeiro do Rio Águeda.
Integrado no Parque Natural do Douro Internacional desde 1998, o vale do Águeda discorre em sentido Sudeste-Noroeste, partilhado pelo Concelho de Figueira de Castelo Rodrigo e pela província castelhana de Salamanca. O curso das águas cavou ao longo de milénios uma profunda garganta sobre o planalto granítico, determinando a configuração da paisagem actual de grande beleza em que por entre fragas de dezenas de metros de altura podemos encontrar bosques densos de Azinheira (Quercus rotundifolia) e Zimbro (Juniperus communis) ou arbustos e pequenas árvores como o Zambujeiro (Olea europaea), Sanguinho (Frangula alnus) ou a Cornalheira (Pistacia terebinthus).
A acompanhar um ecossistema bastante preservado surge uma grande riqueza faunística, principalmente ao nível da avifauna, de que falarei no próximo post...

04 setembro 2006

Melro-das-rochas: um visitante ameaçado


O Melro-das-rochas (Monticola saxatilis) é, de entre as várias espécies de melros existentes em Portugal, uma das mais atraentes. Visita-nos a cada Primavera e Verão, vindo da África Tropical, mas fá-lo em cada vez menor número, encontrando-se actualmente classificado como Em Perigo de Extinção segundo o recém-publicado Livro Vermelho dos Vertebrados (ICN, 2006).
No nosso país esta bonita ave prefere as paisagens serranas do Parque Nacional da Peneda-Gerês e Parque Natural da Serra da Estrela, frequentando as áreas rochosas com pastos ou matos rasteiros entre os 1000 e os 2000 metros de altitude.
Na Península Ibérica pouco se sabe sobre as causas do declínio da espécie (em Portugal existirão menos de 2500 exemplares e em Espanha menos de 10 000 indivíduos maturos), o que dificulta a implementação de estratégias de conservação. É por isso um privilégio cada vez mais raro avistar um macho de melro-das-rochas, com a sua espectacular plumagem vermelha e azulada, numa caminhada pelos blocos graníticos da Serra do Laboreiro ou pelos cumes nevados do Parque Nacional de Ordesa y Monte Perdido, onde a foto foi obtida.

28 agosto 2006

O tempo das amoras

Agosto não é só o mês dos incêndios. Por esta altura, em quase todo o território português, um pequeno arbusto, pouco atraente nos restantes meses do ano, revela os seus apetitosos frutos. Falo da Silva, arbusto cientificamente conhecido pelo nome de Rubus ulmifolius, e dos seus rebentos, as amoras.
Nas margens de caminhos ou em terras abandonadas e desde que as temperaturas invernais sejam relativamente suaves prospera o silvado. Constitui em muitas ocasiões um refúgio importante para a fauna com caules que podem atingir os dois metros de altura e espinhos curtos e aguçados.
As amoras amadurecem ao longo do presente mês integrando a dieta de um grande número de espécies animais, desde pequenos passeriformes a carnívoros como a Fuinha (Martes foina) ou a Raposa (Vulpes vulpes). Os frutos são constituídos por 80% de água e uma quantidade apreciável de açúcar, cálcio e vitaminas. Por isso, numa próxima caminhada pelas nossas serras, não perca a oportunidade de provar aquelas duas ou três amoras mais maduras mas deixe as restantes para a fauna selvagem que frequenta esse local...

21 agosto 2006

Vale do Ramiscal - Retratos de uma paisagem desoladora

Cumeada dos Bicos

Couto Grande

Colmadela

Baixo Arroio

Alto Arroio

No jornal Público de Domingo, 20 de Agosto, o director do Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), Professor Henrique Pereira, afirma: "Nos vales mais encaixados do Ramiscal não ardeu tudo, e até nos parece que não foi afectada a área onde a águia-real costuma caçar". Já o Instituto da Conservação da Natureza (ICN) em nota para a Imprensa, a 17 de Agosto, refere: "O Ramiscal é refúgio para uma águia-real. A observação da área ardida revela que as áreas onde esta espécie procura alimento mantêm-se intactas."
Com o devido respeito pelos dirigentes e técnicos envolvidos, estas afirmações não correspondem à verdade. A grande maioria das áreas utilizadas para caçar pelo único exemplar de águia-real do PNPG, as que seguramente apresentavam as maiores densidades de Coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus), foram totalmente dizimadas pelas chamas. As imagens acima publicadas confirmam isso mesmo.

A águia-real é uma das mais raras aves de rapina portuguesas. Segundo o recém-publicado Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, não existirão mais de 60 casais no nosso país, estando classificada como "Em Perigo de Extinção". No PNPG sobrevive um único exemplar.
O desaparecimento desta águia, a verificar-se, confirmará o que desde há anos se adivinha: mais de 30 anos após a sua criação o Parque Nacional, a jóia de coroa da Conservação da Natureza em Portugal, terá fracassado num dos seus objectivos principais. Será altura para questionar: se no local de máxima protecção ambiental foi possível a extinção de um dos animais selvagens mais emblemáticos, o que esperar da conservação do restante património natural português?

Preocupado com a mais que provável falta de alimento que este exemplar de águia-real e outros vertebrados selvagens actualmente enfrentarão redigi a seguinte carta aberta ao Director do Parque Nacional da Peneda-Gerês:

"
Exmo. Prof. Henrique Pereira,

Na sequência dos violentos incêndios que entre 9 e 16 de Agosto assolaram os vales do Ramiscal e do Arroio e os cumes mais elevados da Serra da Peneda, grande parte do território de caça do último exemplar de Águia-real (Aquila chrysaetos) do Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) foi destruído pelas chamas. Os matos rasteiros da Colmadela, Bicos e Couto Grande habitualmente perscrutados por esta rapina em busca de alimento deixaram de existir.

Actualmente esta águia-real, que felizmente ainda sobrevive, e um grande número de predadores ameaçados de extinção, nos quais se incluem o Lobo (Canis lupus signatus), o Gato-bravo (Felis silvestris), o Tartaranhão-caçador (Circus pygargus) ou o Açor (Accipiter gentilis) vivem um período de grande escassez alimentar. Neste contexto venho pedir-lhe para colocar em prática uma medida de baixo custo económico e que seria de grande valia para os vertebrados selvagens desta área do PNPG: a disponibilização de alimentação suplementar para a fauna. De fácil construção e manutenção, a colocação de alimento numa estrutura preparada para o efeito num qualquer local da Serra da Peneda seria um contributo importante para a sobrevivência de alguns dos animais mais emblemáticos do Parque Nacional.

Antecipadamente agradecido pela atenção prestada, com os melhores cumprimentos,
Miguel Barbosa"

10 agosto 2006

O fim da Mata do Ramiscal


Fotografias recentes do Vale do Ramiscal revelavam a diversidade de habitats: o bosque caducifólio, os prados de altitude e as encostas escarpadas.

Hoje é um dia particularmente triste para a Conservação da Natureza em Portugal. Uma das poucas florestas autóctones que ainda existiam no nosso país, a Mata do Ramiscal, integrada no Parque Nacional da Peneda-Gerês, foi na sua maior parte destruída pelo fogo. Enquanto escrevo estas linhas (noite de 10 de Agosto) Azevinhos (Ilex aquifolium) centenários são consumidos pelas chamas.
O Vale do Ramiscal é um vale remoto do Alto Minho com cerca de 10 quilómetros de extensão que se dispõe no sentido Este-Oeste. A maior parte da sua área está protegida legalmente pelo máximo estatuto de protecção ambiental, o de Parque Nacional.
A Mata do Ramiscal estendia-se ao longo da margem esquerda do rio e era formada sobretudo por exemplares de Carvalho-alvarinho (Quercus robur) de grande porte e pelos supra-citados azevinhos. Neste local deambulava o Lobo-ibérico (Canis lupus signatus), a Águia-real (Aquila chrysaetos) cruzava assiduamente os céus e o Gato-bravo (Felis silvestris) refugiava-se no mais espesso do bosque.
Seria difícil encontrar uma maior diversidade e riqueza natural no nosso país. Nos últimos dois dias tudo isto desapareceu! A Mata do Ramiscal morreu! O solo carbonizado estende-se do rio até ao ponto mais alto da Serra do Soajo. A Natureza lusa está de luto, o Parque Nacional da Peneda-Gerês nunca mais será o mesmo, a minha tristeza é imensa...

04 agosto 2006

Os Carvalhos centenários do Parque Natural de Redes


Carvalhos de Llanu´l Toru, localizados numa das zonas de maior protecção ambiental da Cordilheira Cantábrica

Quem percorre o imponente bosque Saperu no Parque Natural de Redes (Principado de Astúrias), por entre a interminável sucessão de Faias (Fagus sylvatica) descobrirá um espectáculo natural que não esquecerá facilmente.
No mais recôndito da floresta abrigam-se gigantescos exemplares de Carvalho-alvarinho (Quercus robur), com mais de 10 metros de diâmetro. Estas árvores centenárias, inúmeras vezes fustigadas por relâmpagos, ainda hoje dão protecção e alimento a uma rica fauna cantábrica que delas depende. Devido ao seu óptimo estado de conservação provavelmente sobreviverão por mais algumas centenas de anos...

28 julho 2006

Parque Natural de Redes

Cantu l´Osu - montanha mítica do Parque Natural de Redes com 1800 metros de altitude
Cuetu Negru - montanha rodeada pelos extensos faiais de Mongallu e Pociellu
Cascata de Tabállon - local de inesperada beleza que se atinge após cruzar o fabuloso bosque Saperu

Na região Oriental das Astúrias existe um território de 377 quilómetros quadrados de extensão classificado como Reserva da Biosfera pela Unesco: o Parque Natural de Redes.
Trata-se duma região montanhosa, com a altitude máxima de 2104 metros no Pico Torres, relevos abruptos, com bosques de grande extensão (33% da superfície do Parque corresponde a bosques maduros) e uma fauna das mais ricas e diversificadas da Europa, podendo-se referir a título de exemplo uma representação importante do galo-montês (Tetrao urugallus) há muito extinto em Portugal.
Existem inúmeros trilhos que podem ser percorridos merecendo particular destaque a Ruta del Alba, declarada Monumento Natural pelo Principado de Astúrias em 2001.

19 julho 2006

Pinheiro-silvestre: a conífera autóctone do Parque Nacional da Peneda-Gerês


A caminhada é longa e árdua. É preciso percorrer vários quilómetros de um trilho íngreme e pedregoso para alcançar este local escondido da Serra do Gerês. Mas vale a pena: perante nós encontram-se os últimos representantes de uma época remota.
Há milênios os glaciares cobriam o topo do Gerês. O bosque, restringido às altitudes mais baixas, era constítuido por coníferas principalmente pelo Pinheiro-silvestre (Pinus sylvestris), árvore imponente de folhas perenes e tronco avermelhado. Com o fim da glaciação de Wurm e o recuo dos gelos, estes pinheiros passaram a ocupar o topo da serra, enquanto que os vales mais abrigados foram colonizados pelo Carvalho (Quercus robur).
Os pinheiros-silvestres representavam para o Gerês o que os Pinheiros-negros (Pinus nigra) representam para os Alpes. No ínicio da nossa era formariam um bosque extenso, magnífico. Com a necessidade de pastos para o gado e da madeira por altura dos Descobrimentos estas florestas foram queimadas e derrubadas, restando na actualidade apenas alguns exemplares para testemunhar a grandeza desses tempos.
Sempre que subo a um dos cumes graníticos do Gerês não consigo deixar de imaginar como seria se os vales abruptos que desfilam diante de mim ainda estivessem recobertos por estes bosques primitivos!

13 julho 2006

O Faial

Bosque da Enramada - Um dos maiores faiais ibéricos, no Parque Natural de Somiedo, fotografado no Verão
Bosque de Pome - Faial maduro junto ao Rio Pomperi, no Parque Nacional dos Picos de Europa, fotografado no Outono

Nas vertentes Norte da Cordilheira Cantábrica desenvolve-se o mais belo bosque caducifólio da Península Ibérica: o Faial.
A Faia (Fagus sylvatica) é uma árvore robusta que pode alcançar os 40 metros de altura, de tronco recto e cilíndrico e coloração acinzentada. As folhas são ovais ou elípticas e formam uma copa muito densa que produz uma sombra espessa.
A floração coincide com o surgimento das folhas, em Abril e Maio, e os frutos amadurecem em Setembro e Outubro caindo em Novembro.
Devido à sua elevada transpiração a faia, para se desenvolver, necessita de um ambiente húmido, com abundantes brumas e névoas.
A sombra que produz impede o desenvolvimento do estrato herbáceo (a sua cobertura frequentemente não ultrapassa os 5% do bosque). Por isso o faial é um bosque "limpo", sendo perfeitamente possível caminhar por entre as suas arvores como se de um jardim bem cuidado se tratasse.
Nenhuma floresta europeia consegue transmitir com tanto vigor a passagem das estações: desde os troncos despidos e cobertos de neve do Inverno, ao verde intenso e fresco do Verão, passando pela explosão fugaz de cores do Outono.

10 julho 2006

Ouriço-europeu: a principal vítima de atropelamento


Com um corpo pequeno e rechonchudo, recorberto de espinhos com 2 a 3 cm de comprimento, o Ouriço-europeu (Erinaceus europaeus) é um animal inconfundível da Fauna Ibérica.
Embora seja uma presença assídua das áreas abertas (prados, zonas de cultivo) limitadas por fileiras boscosas ou arbustivas e ocupe uma ampla franja altitudinal desde o nível do mar até ao limite superior do bosque (em Portugal até aos 1200 metros de altitude), o ouriço encontra-se ameaçado.
A sua marcha lenta e principalmente o seu particular sistema defensivo perante ameaças (a imobilização, confiante no papel dissuador dos espinhos que o revestem) levam a que seja uma das principais vítimas de atropelamento das estradas ibéricas. O desenvolvimento da rede viária agrava a cada dia o problema.
Por isso se uma destas simpáticas criaturas decidir estabelecer-se no seu jardim não a expulse: provavelmente esse jardim é um dos poucos locais seguros que ainda restam para o nosso ouriço...

06 julho 2006

O Teixo



Caminhando pelas serranias do Gerês é possível encontrar em vales abrigados, "pequenas" árvores com 10 a 15 metros de altura, com troncos retorcidos avermelhados e folhas de um verde profundo: são os Teixos (Taxus baccata).
Estes exemplos de elegância vegetal constituem provavelmente os seres vivos mais antigos do Parque Nacional da Peneda-Gerês uma vez que há exemplares com mais de 1500 anos de idade!
Esta espécie dióica, ou seja com indíviduos femininos e masculinos distintos, distribui-se pelas florestas mistas da Europa, Norte de África e Sudoeste da Ásia. No nosso país encontra-se restringido às Serras do Gerês e da Estrela.
Todas as partes verdes do teixo são tóxicas o que motivou a sua destruição sistemática desde há séculos pelos efeitos nefastos sobre os animais domésticos. Contudo, esta árvore venerável é uma das maiores aliadas do Homem na grande luta do século XXI: o cancro. Dela se extraem os taxanos que constituem uma das principais armas da medicina moderna para os tumores da mama, pulmão, bexiga, esofágo, ovário, próstata e muitos outros.
É impossível ficar indiferente a esta árvore: percorrer a floresta de Albergaria numa tarde nevosa de Inverno e encontrar um teixo com as suas inconfundíveís bagas vermelhas transporta-nos para um Portugal de há milênios, cheio de magia...